sábado, 9 de janeiro de 2010

Em homenagem ao Daniel!


Quem já leu o livro descobriu nas primeiras páginas uma pequena homenagem ao Daniel Schneider.

Para quem não nos conhece pessoalmente, vou então falar um pouco do Daniel.
O Daniel era meu Tio, era parisiense, conhecia Paris como ninguém e era casado com a minha Tia Rosa, irmã do meu pai.
O Daniel tinha uma personalidade muito peculiar, Deus iluminou-o com uma cultura geral fora de série e um dom natural para as artes, especialmente para a música, pois cantava e tocava maravilhosamente bem! Tocava variados instrumentos, mas o de eleição era a guitarra. O Daniel na juventude, por altura do ‘Maio de 68’, quando saiu da Marinha onde esteve poucos meses, ganhava a vida como músico de Jazz e tocava em diversos clubes de Paris, especialmente na zona de Montmartre. Essa "escola" deu-lhe uma pedalada difícil de acompanhar, eu que também toco guitarra, ao pé do Daniel sentia-me um verdadeiro ignorante e sempre fiz com que a minha guitarra passasse despercebida para não estragar... O Daniel não só tocava divinalmente bem, como tinha uma voz doce capaz de silenciar o mais exigente auditório! O seu meio de eleição era a música francesa, toda ela, e qualquer versão que saía dos seus dedos e da sua voz, mostrava-nos que o Daniel era um talento muito especial. Também tinha muitos originais e várias sinfonias completas, mas se o Daniel tinha esse dom, também tinha uma certa "pancada de génio" e sempre se recusou a divulgar a sua obra. Nunca quis comercializar as suas músicas nem dá-las a conhecer a quem não o conhecia, porque na sua perspectiva, o dinheiro era um cancro que destruía a essência de tudo e por isso, só os amigos poderiam aceder à sua arte, gratuitamente e quando o momento o proporcionasse! Um desses amigos era o Manuel Freire o tal da Pedra Filosofal e também ele se rendeu ao encanto do Daniel! Quando o Daniel pegava na guitarra, era só deixá-lo ir que íamos parar a um universo perfeito!
Conheci o Daniel tinha quase 13 anos e o meu irmão Carlos faleceu pouco tempo depois. Eu e o Daniel, ano após ano fomos construindo uma amizade especial, não de tio/sobrinho, mas mais de irmãos o que me ajudou a ultrapassar a dor da perda do meu mano! Veio a adolescência e também a liberdade total, pois com o Daniel podia ir a qualquer lado e a qualquer hora. Tínhamos carro, tínhamos dinheiro, tínhamos as violas e muitos amigos. Foram tempos maravilhosos, tempos de muita e sã boémia, com o Daniel nunca se ultrapassou o limite do aceitável! Talvez fumássemos demais e bebíamos um pouco, mas nunca pisámos areias movediças. Recordo hoje com muita ternura, todos os momentos preciosos que passámos juntos!
Um dia, ainda namorados, eu e a Lígia tivemos uma ruptura irreversível e o mundo para mim pareceu acabar. Nessa noite, eu e o Daniel estivemos até de manhã a tocar viola, na minha salinha de música. Já de manhã, o Daniel olhou-me nos olhos e disse-me, “vai ter com ela e diz-lhe o que sentes no coração”.
Antes, o mundo parecia-me perdido, a Lígia separou-se de mim ‘para sempre’ e também eu me separei dela com o mesmo sentimento, mas, quando cheguei ao café, sem dormir, parecia-me aquele conselho tão simples, ridiculamente desajustado face à enormidade das diferenças que nos separaram! Encontrei-a com os olhos inchados, a beber um café e a fumar um cigarro. Olhámo-nos e nada dissemos, apenas nos beijámos e ainda hoje estamos juntos!

O Daniel morreu num sítio que ele sublimava, a montanha! Morreu de ataque cardíaco nos Alpes, durante a "classe de neige", com os seus alunos, pois o Daniel era professor primário.

Que saudades do Daniel!
Grande Daniel!

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